OLHA AÍ! É O MEU GURI


Impressionante como é a vida de um subumano...
Hoje, ao esperar um amigo ir à padaria, deparei com um garoto se deliciando com um pão francês e um copo de café com leite. Mais me impressionava aqueles dentes brancos do que a fome aparente do guri, já que o mesmo mastigava com uma boca muito boa. Impressionava aqueles dentes não só por serem perfeitos, mas por serem tão alvos mesmo envoltos na anti-higiene enraizada do menino. E me impressionavam ainda mais seus dedos sujos de uma crosta preta que eram lambidos com a mesma boca que comia o pão. Era ele.
Ao me aproximar, o garoto já fazia menção de pedir algo quando intercalei primeiramente:
- Hoje você comeu muito, hein?
- É. Me dei bem.
- E vai ficar por aqui até quando?
- Não sei. Eu moro por aqui mesmo.
- Mas você podia estudar ao invés de ficar aqui na porta da padaria...
- Que nada, na rua a gente come do bom e do melhor! O ruim é a humilhação, mas com isso a gente acostuma.
- Mas você não tem pai ou mãe não?
- Tenho mãe só. Mora ali no morro.
- E por que você não vai pra lá? Pro conforto da casa?
- O marido dela me mata se eu for lá, por isso vivo por aqui.
- Mas e o frio? E o calor?
- Eu durmo enrolado no papelão, quase não sinto frio.
- Mas precisa se molhar, se refrescar, se limpar...
- Lá na Praça da Estação tem um tanto de fonte. Todo mundo vai pra lá tomar banho. De vez em quando eu vou também.
- E você quer continuar nessa vida pra sempre?
- Não, mas eu não posso ir pra casa agora. Vou dar um tempo, quem sabe eu estudo um dia? Quero poder pagar um pão pra algum dos manos.
Nesta hora bateu uma vontade de levá-lo pra casa, dar um banho e um pratão de comida e entregá-lo à alguma organização responsável, capaz de transformar aquele garoto em um homem de bem. Mas não fiz nada disso, fiquei paralisado e de mãos atadas. Só escutei meu amigo que estava na padaria me chamar e me tirar do devaneio. Mas antes perguntei ao guri:
- Quantos anos você tem?
- 10! - falou mostrando todos os dedos sujos da mão encardida.
Mais um que provavelmente não viverá o amanhã, mas que, também provavelmente, já viveu mais que muita gente de trinta anos, em meio à tanta violência, pobreza, tristeza, miséria e falta de humanidade apostada nas pessoas que deveriam criá-lo, e não apenas desová-lo no asfalto de uma metrópole.
Indo em direção ao trabalho, pude ainda ouvi-lo dizer:
- Falou, véi!
Danilo Meiras

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